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  • Milena Velloso

Meu taurino favorito


​​Há um mês tento escrever algo significativo sobre a nossa tão modesta vidinha aqui no Vale. Esse texto, que custo a parir, é a 31ª postagem do blog, deveria ter saído lá atrás, próximo ao meu número de sorte e dia natalício, 17 de maio. Adoro ser taurina e aqui mantive esse gosto, nos muitos enfrentamentos que me foram convidados ou impostos desde que pra cá me mudei, me dei ao luxo de manter alguns auto-enganos e ser taurina é com certeza uma dessas identificações bobas de que não abro mão, pois resume de forma ampla e ao mesmo tempo irrelevante os meus Id, alter e ego.


Enfim, toda a estrutura de minha frágil, volátil e impulsiva personalidade. Uma colega do meu colega Franciel Cruz, taurino como eu e cujos textos brilhantes e leves me fazem seriamente repensar se posso mesmo de fato escrever, acaba de revelar que o companheiro Che não nos é próximo somente em lealdades, lutas e lado, mas também no signo. Um erro o colocou levianamente ao lado dos nossos vizinhos geminianos, mas na verdade Che é um taurino. Me empolgo com essa incrível descoberta e esse pequeno feixe de luz me permite luminosidade suficiente para aquecer os meus frios pensamentos e coluna lombar, que insistem em trincar quando a noite e a temperatura começam a cair e resolvo sentar-me e enfrentar o branco neve da página para dedicar-me aos relatos banais do nosso invernito capônico que chegou com o charme habitual de todos os anos.




Fui alertada por meu pai, profundo conhecedor das previsões do tempo, que em 2016 não teríamos inverno, culpa dos irmãos niños, macho e fêmea, que levariam com eles as baixas temperaturas e todo charme de nos vestirmos bem pelo menos uma vez por ano. Eu, claro, prefiro atribuir a responsabilidade por mais este desastre climático ao nosso Temerário golpista interino. Em tempos de golpe, nem inverno direito podemos nos dar ao luxo, ainda mais se o aquecimento for à base de sopa de feijão, dado o preço atual do mantimento batendo a estratosfera. Quem não vai de Nova Iorque vai de Madureira, já cantava Zeca Baleiro. Sopa de abóbora será, colhida aqui mesmo, brotou do chão por vontade própria, mais ou menos como tudo o que acontece por essas bandas, sem muito controle ou regra.


Preciso retornar ao foco dessa postagem: Vida no Vale, Vida no Vale, Vida no Vale... Ananda interrompe o fluxo de pensamento vazio comemorando com inusitado exagero para sua sutil personalidade o último dia de aula e narrando em alto e bom tom a sua avaliação de semestre, onde, linda e singelamente, discorre sobre os aprendizados e atividades mais importantes desenvolvidos ao longo do período: a de que a descoberta do Brasil foi na verdade uma invasão portuguesa, o mutirão semanal de limpeza da sua escola, do projeto das frutas, a passeata do meio ambiente e reforma dos jiraus, entre outras. Enho um breve momento de felicidade, porque viemos pra cá exatamente para que nossos filhos tivessem esse tipo de vivencias. Esse breve recorte e abrupta interrupção, juntamente com as palavras: invasão e passeata, me remetem de volta a aridez da macropolítica, a Che e essa dimensão me atropela e já não consigo mais me ater as pequenas singelezas que me arrebatam diariamente e justificariam sem nenhum exagero uma crônica para cada uma delas, embora não me julgue competente para tanto. A Vida no Vale se tornou, desde o golpe, acompanhar a rotina fatídica das pautas do STF e aguardar por mais uma bomba temerária ou áudio vazado que quando não acontecem já nos deixam com uma certa síndrome de abstinência, nos sobressaltando e tirando o fôlego, nos convidando a a aprofundar a reflexão e pensar seriamente como chegamos onde estamos. Assim que tudo ficou muito igual, primeiramente #ForaTemer. Paralelamente, me disciplino a pensar e sentir o que penso, sinto e vivo aqui, eu mesma e nós 7, família de humanos e caninos adentramos o início do ciclo das visitações tão esperadas nos dias que antecedem os grandes feriados. Vivemos entre atos e hiatos dos festejos que se seguem tão aguardados pela saudades daqueles que deixamos para trás, mas não necessariamente fora de nossos quentes corações.

​Assim chegamos em junho, o mês que marcou a nossa decisão 10 anos atrás em um dia viver aqui, quando viemos inadvertidamente para o nosso primeiro festejo junino no Vale. De lá pra cá muita coisa mudou, em mim, em nós, no Vale e no nosso país. Aceitar a dor das perdas, das escolhas que fazemos, seja pro bem ou pro mal faz parte da maturidade e dos movimentos da vida, que nem sempre sopram a favor, por mais que teimemos como bons taurinos em insistir no único caminho, que no meu caso será sempre à esquerda, nunca à direita e viva la revolucion!!! Mas a bem da verdade é que seguir em frente sim, é que é a única coisa que nos ata ao resto, ao todo, a todos os lados, a todas as gentes e fazer isso com apego à vida, com gosto de viver, não importando o que esse “seguir” nos imponha de desafios em convivências e diálogos é o que precisamos vivenciar . Felizmente os amigos queridos e saudosos logo chegarão, nos aquecendo com momentos quentes e verdinhas geladas. Apesar de o Brasil seguir em um caminho estranho e perverso, nós aqui e muitos tantos em outros lugares seguiremos ocupando o que nos cabe em direitos e esperanças. Che, do alto dos seus 88 anos, número que contêm o infinito duas vezes, que nos ilumine , ele e as lindas lanternas que nesse período preparamos para a festa de São João e o passeio da menina da lanterna. Como diz a música da peça, caminhemos pois se “a luz apagou, pra casa eu vou com a luz do meu coração”.


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